Segunda temporada de ‘A Casa do Dragão’ assume sua falta de identidade e abraça o fan service

Ítalo Passos
5 min readAug 5, 2024

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Em sua nova temporada, a série filha de GoT deixa evidente que não pretende ter uma personalidade própria.

Dentro de um contexto de guerra civil, A Casa do Dragão chega para sua segunda temporada, com uma boa carga dramática após sua temporada inicial que, consegue contextualizar bem o momento histórico daquele microcosmo. Mesmo com personagens frágeis em relação a profundidade e desenvolvimento, a série conseguiu manter meu interesse, pois, o dinamismo narrativo me atraiu e me deixou bastante otimista, já que o conceito de contar a história como se fossem vários contos em tempos diferentes me agradou, pois, toda a trama ficou mais dinâmica.

É sintomático que uma série “filha” de um dos maiores sucessos de audiência da emissora sofresse com comparações desleais ou até mesmo com ligações ilógicas. Como a citação do conto de Gelo e Fogo, pelo Rei Viserys (Paddy Considine) para sua sucessora Rhaenyra (Milly Alcock). Mas enquanto obra, A Casa do Dragão não pode depender de ligações externas, referencias ou fan service. É uma série que tem todas as ferramentas para ser independente em relação a identidade, não me entenda mal, não digo que a série se conectar com Game of Thrones é algo que a torna ruim, mas não pode depender disso.

Existe um contraste gritante na obra quando se leva em consideração o ritmo, enquanto na temporada inicial temos mais episódios e uma narrativa dinâmica, divertida e que flutua pelo tempo. Com Viserys sendo o grande destaque, já que seu personagem é o principal alicerce da temporada. Já a nova temporada parece estagnada, como algo gigantesco que demora bastante tempo para se movimentar. É uma temporada com menos episódios, mas a impressão que temos é que ela se perde na sua falsa reflexão. Ao mesmo tempo que parece que os personagens estão surfando em grandes arcos narrativos, a verdade é que, ele permanece exatamente onde sempre esteve, mudando apenas seus cenários.

Evidente que Daemon (Matt Smith) é a melhor demonstração de como chafurdar um personagem interessante em uma trama absolutamente desnecessária. Cenas vazias e sem significado ou relevância para a trama, durante toda a temporada, Daemon fica no limbo, lidando com personagens passivos, onde a trama se mova em um ritmo maçante. Reparem que após a visão do personagem do futuro de sua casa, ele volta exatamente para a posição que estava no último episódio da primeira temporada. É um desperdício enorme, ao mesmo tempo que passa a impressão de que os roteiristas não fazem ideia de como preencher o número de episódios requisitados pela emissora.

Assim como em outras grandes produções, fica evidente o desespero da série em criar cenários que servem apenas para criar uma empolgação maquiada, O fan service gratuito tem crescido em produções mainstream, tornando-as ainda mais vazias, é como uma casca de um produto repetido, mas com uma embalagem nova e a qualidade inferior. Larys Strong (Matthew Needham) é um exemplo de personagem desenvolvido para ser uma espécie de Mindinho, o que eles não entendem, é que não há interesse de ver os mesmos personagens e a mesma história, é preciso de algo novo, com personalidade própria. A série simplesmente sofre com a escassez de bons personagens, algo que a sua série “mãe” tinha aos montes. (Creio que, no final do texto, você vai entender os motivos de eu sempre citar GoT).

Alicent (Olivia Cooke) e Christian Cole (Fabien Frankel) se destacam como os personagens que tem cenas interessantes, aliás, são os poucos personagens da temporada que realmente tem algo a dizer. Christian, como um cavaleiro amargurado, que tenta sustentar toda a situação, onde se vê impotente perante forças mágicas, como os dragões, criando uma áurea sombria no personagem. Não que ele seja o mal encarnado, mas o medo e a paixão, fazem com que Cole seja um personagem que traz uma carga dramática relevante para justificar suas ações.

Já, Alicent tem sua ligação emocional diretamente afetada, seus filhos entram em um buraco cada vez mais fundo, sendo absorvidos por um sentimento de vingança implantado ali. Já com sua ex melhor amiga, Rhaenyra (Emma D’arcy) se mantém distantes, ao mesmo tempo que suas dores os aproximam. Ambas entendem que jamais se curarão do que já foi feito, mas Alicent permanece ainda mais perdida, ao notar que ao se deixar ser manipulada, ela entrou em um ciclo de morte e sangue sem fim. É uma das melhores personagens da série, uma das poucas que exploram os tons de cinza e sai da chatice que se tornou a moralidade por parte da Rhaenyra, essa que teve uma temporada apagada, Emma D’arcy precisa lidar com um texto sem sal, parece que a personagem só reage ao que os outros fazem, sem se aprofundar minimamente, nem em seu luto, pois apenas não a colocam em cena.

Otto Hightower (Rhys Ifans) é outro personagem que gosto bastante, foi totalmente negligenciado durante toda a trama, sem relevância, sem cenas, desaparecido completamente. E durante toda a temporada, entendemos que o mesmo voltou para sua cidade natal, para ajudar organizar os exércitos em apoio aos verdes, mas no momento final da temporada aparece preso, sem nenhum contexto, na esperança de talvez, conquistar a curiosidade de seu público, já que, além da curiosidade, não restam muitos motivos para ainda haver interesse em acompanhar a série.

É uma temporada sem nada marcante, ou com algum episódio que realmente empolgue, são eventos que acontecem por acontecer, são batalhas feias, mal filmadas, com uma profundidade horrível e o uso do CGI é mal aplicado. A visão do Daemon mostra como a série “filha” de Game of Thrones deve seguir padrões para manter sua audiência, a aparição gratuita de Daenerys, toda a importância e peso que os personagens estão colocando na canção de Gelo e Fogo, é um grito de socorro dos idealizadores, que parecem não fazer ideia de como tapar o buraco para que a série tenha o número de episódios que a emissora deseja.

Claro, como mencionado a cima, a série vai conseguir manter boa parte de sua audiência, principalmente enquanto usar o fan service como a lama em que o porco chafurda, e seu público aplaude a sujeira.

Nota: 2/5

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