O divertido e conveniente ‘Golpe de Sorte em Paris’

Ítalo Passos
3 min readSep 19, 2024

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Em seu novo filme, Woody Allen brinca com o absurdo mas pesa a mão em um roteiro cheio de conveniências.

Mesmo controverso, Woody Allen segue carreira, mas neste momento em uma tocada mais underground, trabalhando com narrativas mais simples, histórias menos chamativas e assim como no seu filme anterior, saindo um pouco da sua marcante Nova York.

Fanny (Lou de Laâge) e Jean (Melvil Poupaud) têm tudo que um casal sonharia em ter: realizados na vida profissional, vivem em um apartamento magnífico em um belo bairro de Paris e parecem estar perdidamente apaixonados. Mas quando Fanny cruza, por acaso, com Alain (Niels Schneider), um antigo colega do colégio, ela é imediatamente devorada pela nostalgia. Eles criam o costume de se encontrar durante o horário do almoço e se aproximam cada vez mais, com isso, uma relação de infidelidade entre os ex colegas de escola se constrói.

O que me chamou atenção em Golpe de Sorte em Paris, foi o desprendimento ao absurdo na história, acho que os personagens caricatos, principalmente Jean, que consegue ser um sociopata trabalhado na caricatura de um burguês que mal anda com os próprios pés e vive falando em construir a própria sorte.

Jean é o personagem responsável por levar a narrativa a ser uma caricatura da própria filmografia de Allen, é desprendido de uma pretensão exagerada, foca em trabalhar bem a relação de seus personagens, deixando a câmera correr lentamente em cena, com poucos cortes, exaltando seus diálogos e mesmo funcionando na maioria das cenas, o filme toma um ritmo um tanto “pesado”, apesar de, não ter achado o ritmo arrastado, sua narrativa flui bem, mas senti uma repetição dentro da própria forma de contar a história, que enrola um pouco para resolver sua situação, e um roteiro com soluções convenientes, visando criar uma sensação de dúvida na protagonista. Um bom exemplo, é quando Funny vai investigar a gaveta secreta de Alain apenas quando decide ir lá pela última vez, mesmo tendo ficado deprimida por conta de toda situação, mesmo tendo vários motivos para ir lá novamente, a personagem só resolveu ir no momento em que era conveniente para a história.

Apesar do filme tentar criar uma ambientação que atrai nossa atenção em momentos pontuais para os planos externos, a fotografia não consegue transformar Paris em um ponto realmente relevante para a obra, já que em diversos momentos importantes do filme se passam em uma região florestal, afastada da cidade. Paris acaba não sendo bem explorada pelo diretor, e o filme, em diversos momentos aparenta ser ambientado em uma cidade aleatória.

Essas resoluções convenientes até me tiram um pouco do filme, assim como a ambientação genérica, mas ele funciona muito bem em sua conclusão, consegue criar uma situação elaborada, tão absurda quanto todo o filme é, seguindo coerente dentro da própria pretensão, essa resolução, além, de me tirar uma boa risada, brinca com a forma de como Jean acabou criando a própria sorte, é irônico e divertido.

Gosto como a música a todo momento não nos deixa esquecer que o filme não está se levando a sério, por tanto, não nos apeguemos a isso. É uma música divertida e dançante, tem um ritmo bem grudento, isso ajuda a reforçar as intenções da obra, mas mesmo sendo muito grudenta dentro da narrativa, ela acaba no esquecimento poucas horas após o filme.

É um filme que vejo o Allen e todo o elenco se divertindo enquanto filmavam, mas está bem longe de ser um dos mais marcantes do diretor, que, por mais que ele saiba filmar diálogos muito bem, nos colocando em meio aos personagens de uma forma muito natural, atraindo nossa total atenção para aquele momento, peca em não conseguir ligar todos os elementos da obra, que sejam envolventes o suficiente para que todo o microcosmo do filme funcione como algo único.

Nota: 3/5

Direção: Woody Allen

Ano: 2023

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