‘Guerra Civil’ e a imparcialidade de Alex Garland

Em seu novo filme, o diretor tenta mostrar a importância do jornalismo de guerra. Mas derrapa ao ficar em cima do muro.

Alex Garland nos coloca em um mundo onde os EUA finalmente chega em um estágio de nação quebrada, onde entendemos, com o pouco que o diretor deixa claro, ou faz questão de esclarecer, que a fragmentação entre estado, grupo de “libertação” e milícias entram em conflito, um desses grupos almejam o mantenimento do poder, outro a tomada do estado para controle próprio com a narrativa de “libertação” e outros vários que apenas aproveitam a desordem para fazer uma limpeza racial e ideológica.

O filme não se aprofunda em nenhum ponto específico, com o que tenho de entendimento sobre os Estados Unidos da América, tirei minhas próprias conclusões. E por mais que não seja necessário ficar explicando para o público de forma extremamente didática, aqui faz falta, pois não são uma ou duas cenas que, acompanhando os jornalistas de guerra, Lee (Kristen Dusnt) e Joel (Wagner Moura), nos questionamos, o que está se passando, os motivos de dois grupos estarem se enfrentando, os reais motivos para chegarem até aquele ponto?

Como mencionei acima, se você não tiver uma noção um pouco mais elaborada de como funciona aquele país, o filme deixa a entender que simplesmente dois grupos entraram em conflito e se deu início a uma guerra ideológica.

É importante trazer o fato de que não existe um grupo revolucionário no filme, não existe alguém lutando contra o sistema, é estado autoritário vs um braço do exército norte-americano. Então, dentro desse sistema de guerra civil, os revolucionários (que não existem no filme) foram exterminados por milícias em cidades menores do país. Esses grupos caçam e matam sem dó qualquer ser que eles julgam “não serem americanos de verdade”. Bom, como o filme deseja que eu interprete os fatos, vejo desta forma.

Em uma das cenas em que vemos alguns membros dessas milícias em ação, temos Jesse Plemons interpretando um desses soldados milicianos. Onde o mesmo atua como juiz e carrasco. Questionando a etnia dos protagonistas e de quem os acompanhavam, e se ao primeiro sinal de “não americano”, os assassinavam sem dó. Plemons controla a cena muito bem, com movimentos insinuosos, com sua arma em punho, nos deixando desconfortáveis e tensos com aquela situação. O filme abre esse pequeno debate sobre “ser americano” e é interessantíssimo. É de longe a melhor cena do filme. Vejo que se o longa seguisse por esse caminho, talvez o Garland tivesse um filme mais consistente em mãos.

Um ponto que me agrada são as atuações, acho interessante o arco da Lee, que sai de uma pessoa fria e que não deixa seus sentimentos se apoderarem dela para que não abra espaço para nenhum tipo de fraqueza. Até que isso é quebrado quando a mesma tira uma foto de um colega de profissão morto e logo em seguida apaga a imagem, trazendo assim uma mudança de direcionamento do que Lee acreditava. Kristen Dunst mais uma vez muito bem (como sempre), ajuda a nos manter firmes no filme, mesmo que a todo momento me peguei questionando coisas que não eram para serem questionadas.

Como o fato do grupo de jornalistas não terem uma posição em relação ao conflito. Não existe imparcialidade, principalmente dentro de um trabalho tão importante quanto jornalismo de guerra. O filme ainda cria situações claras para demonstrar a imparcialidade de Garland, como quando Joel encontra dois snipers em um confronto de paciência e questiona “em quem vocês estão atirando, de qual lado ele está, por qual lado vocês lutam?” e nos entrega uma simples resposta de “Estão atirando em nós”.

São situações como essa que Guerra Civil não me pegou o suficiente, mesmo achando um bom filme, principalmente por conta de seus personagens e design de som, mas sinto que não existe nada além para um debate futuro, o filme se escora no contexto da nossa sociedade atual, e só saberemos se esse filme funcionará fora deste contexto no futuro.

Nota: 3/5

Direção: Alex Garland

Ano: 2024